terça-feira, 18 de janeiro de 2011

Festival de gelo e blues em Strathcona

Já falei aqui de Vancouver, na província da Colúmbia Britânica, no Canadá, um lugar pelo qual eu sou apaixonada (ver post anterior). Mas hoje quero falar de outra região do país, bastante diferente de BC e com características marcantes do pólo norte. Vou falar da província de Alberta e mais especificamente da cidade de Edmonton, onde estou morando com o Newtinho, meu marido, deste novembro do ano passado.

Aqui vive o típico canadense que, infelizmente, nos últimos anos vem se parecendo muito com o americano padrão, dada a proximidade e as intensas relações comerciais desenvolvidas entre os dois países. Este cidadão come muita besteira, não é muito envolvido com arte e cultura e adora esquiar. A influência country é marcante e não é raro topar com cowboys de filme pelas ruas de Strathcona, bairro histórico e um dos locais mais charmosos da cidade.

Demorei a entender que Vancouver, onde eu havia morado há dez anos, é uma exceção do país. Claro, uma linda e divertida exceção, mas que não pode jamais ser tida como exemplo do estilo canadense. Assim como Nova York não reflete o estilo americano tradicional, Van é uma cidade do mundo e aglomera culturas e nacionalidades de todos os cantos.

Se é possível falar de um típico cidadão canadense – os imigrantes são mais da metade da população – provavelmente este sujeito mora em Alberta. É quase certo também que ele goste do frio. A neve é parte importante da identidade cultural dos moradores. É quase um orgulho nacional. E, sem dúvida, temos que tirar o chapéu para a forma como este povo aprendeu a lidar com um clima tão inóspito. Incrivelmente as coisas funcionam bem. E olha que o inverno aqui é longo e a neve, que aqui dura vários meses, faz com que as temperaturas se tornem assustadoras.

Muita gente me pergunta como é viver em um lugar onde as médias de inverno ficam entre -15c e -20c. E eu digo sempre. Não, não é fácil. Não, não é divertido. Não, não é charmoso. E sim, é difícil. Mas dá para viver. Nunca falta comida. Ainda que quase nada seja produzido aqui, encontra-se de tudo nos supermercados a preços bem razoáveis. O transporte é ótimo e assim é possível planejar seu trajeto em meio a um dia gélido sabendo que o ônibus não vai te deixar na mão. Esqui e showboard são uma mania nacional. E, para os namorados, há também várias pistas de patinação ao ar livre. Para os consumistas, em Edmonton fica o maior shopping center da América do Norte e um dos maiores do mundo, o West Edmonton Mall. Até eu, que não acredito estar incluída nesta categoria, tenho me divertido bastante por lá. O lugar é um mundo, tem aquário, show de focas, uma réplica perfeita da caravela Santa Maria de Colombo e até uma praia artificial. E as lojas são muito boas e com preços excelentes. Vamos ser sinceros: comprar traz alegria, mesmo que falsa, mas traz!

Além disso, a cidade não tem muito mais o que oferecer. Quando o frio aperta demais, com as insuportáveis nevascas, não há muito o que se fazer e fica-se  muito em casa. Os últimos dias haviam sido assim, meio tristonhos. As nevascas e um frio absurdo nos detiveram em casa a maior parte do tempo, o que não é muito saudável. Sair aqui é importante e, muitas vezes, é preciso nos forçar a isso, para não cairmos na conhecida depressão de inverno.

Foi o que fizemos nesta segunda-feira. A programação escolhida foi o “Ice on Whyte Festival”, um festival de esculturas de gelo que acontece todos os anos em Edmonton. Devidamente equipados com casacos, blusas de lã, cachecol, perneira, gorro e luva, lá fomos nós! Antes, no entanto, tivemos que abrir uma trilha na porta de casa, já que a neve já passava da altura do joelho... Sem desanimar seguimos em frente.
Newtinho abrindo uma trilha na neve para sair de casa

O festival segue o mesmo estilo de uns eventos russos, que acontecem em Moscou. Escultores do mundo inteiro vêem à cidade para participar de uma competição de obras de gelo, que ficam expostas ao público em um terreno fechado, dentro do bairro histórico de Strathcona. São dragões, budas, coelhos, figuras míticas e tudo mais que se possa imaginar. É uma exposição ao ar livre estilo polar. No meio de tudo, é montada uma tenda onde são servidos chocolate quente e café, para que as pessoas consigam sobreviver à temperatura e curtir o festival sem congelar.





Esculturas de gelo do Ice on Whyte Festival, em Edmonton

O evento é legal e o mais interessante é ver como os canadenses curtem de fato o frio. Enquanto eu e Newtinho batíamos boca de frio, as criancinhas de Edmonton brincavam no escorregador de gelo e percorriam os muros de um labirinto também de gelo. Saímos do festival felizes, mas com frio no pé. Caminhamos pelas ruas de Strathcona em busca de uma cafeteria para tomar algo quente. Nestas horas, nada melhor do que um Starbucks! Por coincidência, encontramos o Milton, amigo e companheiro de trabalho do Newtinho, também brasileiro e mineiro. Decidimos fazer algo, para aplacar a tristeza de inverno. Tentamos o cinema mais próximo. Não abria segunda. Depois de alguns olhares, decidimos tomar uma cerveja para esquentar a alma e curtir uma boa música.

Fomos no “Blues on Whyte”, a melhor pedida entre os pubs da região. Lá tem música ao vivo todos os dias e as bandas costumam ser muito boas. O show do dia estava a cargo de Morgam Davis, um senhor de Detroit, que mora em Toronto e roda o mundo há anos com sua banda, composta por outros senhores como ele, cheios de estilo e simpatia. O cara é muito bom e, por conta dele, bebemos bastante cerveja e dançamos muito.




Com o fim do show, que por sorte bateu com o horário do nosso ônibus, formos embora com os corações mais aquecidos. A saída do pub, como sempre, trouxe aquele momento de choque. Lá dentro tudo quentinho, pessoas de camiseta, gente dançando. E lá fora, míseros -20c... Nosso ponto de ônibus acumulava quase um metro de neve, uma coisa inacreditável. Mas o veículo nunca atrasa e, neste dia, chegou até antes do previsto. Rapidinho já estávamos dentro do aquecimento de novo e a vida lá fora, tão inóspita, ficava pra trás. Mais um dia havia se passado no pólo norte.


Um pouco de neve no banco do ponto de ônibus

quarta-feira, 15 de dezembro de 2010

Canadá novamente: entre a nevasca de Edmonton e as florestas de Vancouver

Libertária como Amsterdam, litorânea como o Rio de Janeiro, cosmopolita como Nova York, moderna como Tóquio e segura como as cidades interioranas. That´s Vancouver!

Cercada por água e gente de todas as partes do mundo, a cidade está localizada na Província de British Columbia, a oeste do Canadá. Com as devidas proporções e diferenças culturais, o estado poderia ser comparado à Califórnia americana. Banhada pelo Pacífico, BC apresenta uma das mais belas paisagens canadenses e um clima mais ameno se comparado a outras regiões do país. Em Vancouver quase nunca neva e, durante os meses mais frios do ano (dezembro e janeiro), a temperatura gira em torno de -5c e 10c. É um frio charmoso, que não chega a ser desesperante.

Conheci a cidade há quase dez anos, quando vim fazer um curso de inglês e morei lá por cinco meses, de fevereiro a julho de 2001. Minhas lembranças de Vancouver eram as melhores possíveis. Não havia vivido de fato o inverno e tinha visto a cidade florescer na primavera e ganhar ares californianos no verão.

E eis que meu marido resolve fazer um doutorado sanduíche no Canadá em 2010. Mas, para minha tristeza, a cidade escolhida para o curso não foi Vancouver e sim Edmonton, em Alberta. Ao contrário de BC, a Província de Alberta é famosa por seu inverno rigoroso e longo. A neve começa em novembro e vai até abril, o que para uma brasileira como eu é um tanto quanto desesperador. Bom, mesmo com tudo isso, resolvi acompanhar meu marido Newton nesta empreitada à América no Norte e cá estou desde o início de novembro.

Um dos acordos que fizemos para que eu viesse pra cá foi o de que faríamos várias viagens e não ficaríamos só em Alberta sentindo frio. Nada mais perfeito para uma primeira aventura do que Vancouver! Newtinho queria conhecer o lugar onde vivi há dez anos e eu queria rever este lugar, ver se a cidade melhorou ou piorou, encontrar amigos antigos... E lá fomos nós. Fiz um relato por dia, porque as experiências foram intensas demais para serem descritas de forma condensada. Aí vai.

1º dia: Da nevasca ao sol do Pacífico
Saímos de Edmonton no dia 9 de dezembro, às 5h30 da manhã, sob uma temperatura de -10c. Pegamos um táxi rumo ao aeroporto. Às 7h30 o avião partiu. Chegamos em Vancouver debaixo de chuva, o que, aliás, é a cara da cidade! O clima temperado chuvoso faz com que a região tenha temperaturas mais amenas que o resto do país e também traz chuvas constantes, mas que não costumam durar muito.

No aeroporto pegamos o Sky Train e paramos em Downtown, onde era nosso hotel. Deixamos as malas no local e partimos para uma visita exploratória. Com um mapa em mãos é possível andar por todo o centro de Vancouver. Minha área preferida é sem dúvida Gastown. Lá as ruas são menores, há vários cafés charmosos, a iluminação é meio baixa e, em uma certa esquina, encontra-se um relógio a vapor. As lojas com artesanato indígena são lindas e também as mais caras... Eles vendem mini totens, máscaras, esculturas e roupas muito bonitas, mas é preciso ter dinheiro para pagar, o que não era bem o nosso caso... Há quem diga que Gastown é mal freqüentada e que concentra a maior parte dos homeless da cidade. De fato, há algumas ruas desta região onde sentimos que estávamos sendo observados por algumas figuras estranhas. Mas nada que chegue a ser perturbador, ainda mais para dois brasileiros.


Gastown
Em Yaletown estão os melhores restaurantes e bares de Vancouver. Na minha época, estes locais eram todos espalhados. Mas foi feita uma revitalização e agora há ruas inteiras de estabelecimentos que oferecem todos os tipos de comida, desde os frutos do mar (especialidade da região) às carnes vindas de Alberta. A Granville Street é a rua das boates e bares mais animados. Á noite ela é super iluminada, com vários artistas de rua nas calçadas e gente moderna por todos os cantos. É quase uma Las Vegas...

Paramos para comer no Pacific Centre e seguimos a caminhada. Após batermos muita perna, resolvemos tomar uma cerveja no Cambie, um bar mais alternativo que fica na Cambie Street. Ele é mais barato que outros pubs da região e está dentro do charme de Gastown. Por isso é muito freqüentado por estudantes, que vêm de todas as partes do mundo. Do lado do bar tem também um albergue. O clima do Cambie, com um Pink Floyd ao fundo, nos animou para o que seria nossa principal atividade do dia seguinte: o show do Roger Waters!


Uma cerveja no Cambie
Mas o show ainda não era hoje e um dia em Vancouver dá pra fazer muita coisa. Descansamos no hotel e saímos para comer em Yaletown. Jantamos no Earls, eu um gyosa de camarão com tempero picante e Newtinho carne com batata. Para os dois, taças de vinho.

2º dia: Parque e rock’n’roll

Vancouver amanheceu com um céu azul estonteante. Depois do café, partimos para o Stanley Park. Ficamos a manhã toda curtindo o lugar, que é maravilhoso. Uma floresta temperada chuvosa, com árvores gigantescas e bichos por todos os lados. Em um certo ponto do parque, há uma coleção de totens enormes, que nos fazem voltar em outra época. Só isso já bastaria para o parque ser perfeito, mas ainda há um outro atrativo. Além de uma floresta linda, com trilhas fantásticas e vegetação exuberante, o Stanley Park está na boca do Pacífico e, sim, tem praias. Como estava frio, não pudemos andar por nenhuma delas, mas há uma pista de caminhada e uma ciclovia na beira do mar, onde é muito gostoso parar e curtir a brisa do Pacífico.


Uma trilha do Stanley Park

Mesas para lanche no Stanley Park

Totens - Stanley Park


Trilha do Stanley Park


Almoçamos num restaurante estilo fast food japonês em Downtown. Aliás, a cidade é cheia deles, já que há milhões de asiáticos vivendo em Vancouver. Para quem ama comida japonesa, como nós, isso é quase um sonho. É muito mais barato comer peixe e camarão do que carne e, além disso, há chefes japoneses por todos os cantos. Enfim, gastamos menos de seis dólares e comemos uma mega refeição com sushis, sashimis, sopa miso shiro e salada.

Á noite fomos ao show The Wall, do Roger Waters (Pink Floyd), uma sugestão do meu amigo Homero e um presente de minha mãe Telma. O show foi num lugar chamado Rogers Arena, onde acontecem os famosos jogos de hockey. Se alguém imaginou aquele show em pé, de pista, confusão, está enganado. Nada disso. A Òpera do Rock foi vista em cadeiras marcadas, acústica excelente, banheiros fartos e limpos o tempo inteiro e muita cerveja!


Ingressos para o show do Roger Waters


Um funcionário nos levou aos nossos assentos e, quando soube que éramos brasileiros, disse que a Bossa Nova é a melhor música do mundo. Logo no começo do espetáculo tomamos um susto. Um avião explodiu no famoso muro, levantando faíscas e arrancando gritos da platéia. Era só o início. A partir daí mergulhamos no universo do Roger Waters, onde os teachers e as mothers são tão negativamente marcantes... O super boneco do teacher era de dar medo... Segundo Waters, o muro hoje é construído pela mídia. Sim, não sei, mas o fato é que The Wall foi a melhor produção do Pink Floyd e o show foi espetacular ou como o próprio Waters disse no final: fuck amazing Vancouver!


Imagens do show do Roger Waters - Stuart Davis, PNG - The Vancouver Sun

"The teacher" - show Roger Waters - Stuart Davis, PNG - The Vancouver Sun

Roger Waters - Stuart Davis, PNG - The Vancouver Sun


Como todo brasileiro e mineiro que se preze, saímos do show querendo tomar uma última cerveja para reviver cada momento. Nada melhor que Downtown! O centro estava fervendo, com jovens do mundo todo circulando, artistas tocando suas baterias e guitarras nas calçadas e bares lotados. Tomamos uma cerveja num bar não tão legal, mas o único que tinha lugar e não tinha cara de muito caro. Terminamos a noite comendo duas fatias de pizza numa das várias lanchonetes de Vancouver que vendem fatias de pizza. Opção barata, boa e a cara da cidade!

3º dia: Anêmonas de Pandora e jantar japonês

O sábado amanheceu chuvoso em Vancouver e nós meio cansados. Os últimos dois dias tinham sido intensos demais e ainda havia mais coisa por vir. Resolvemos voltar ao Stanley Park de manhã e aproveitar para visitar o Aquário, que fica dentro do parque. Confesso que estava meio com preguiça de entrar lá, tinha fila, muitas crianças... Mas o Newtinho estava louco para ver as baleias Belugas e resolvemos encarar. Ainda bem! Foi um passeio lindo. O Aquário é enorme e, além das Belugas, tem peixes de todas as espécies, anêmonas e águas-vivas cintilantes (parecem as sementinhas cintilantes do filme Avatar), répteis e pássaros. Como sempre no Canadá, tudo é muito bem cuidado, com uma estrutura confortável para todo mundo.

Anêmona 

Água viva

Água viva

Baleia Beluga


Almoçamos por lá mesmo. Ficamos em dúvida entre os tradicionais sanduíches e as opções de fast food asiáticas, que aqui são muito boas e baratas. Mas iríamos jantar na casa de uma amiga japonesa à noite, então optamos pelo sanduíche mesmo, com batatas enormes fritas com casca. Depois do lanche, voltamos para o centro e tomamos um café na Biblioteca Pública de Vancouver. O prédio é um charme, parece uma réplica do Coliseu com o acréscimo de um novo desenho na parte de dentro. É enorme e linda. Na parte de baixo, próximo à entrada do prédio, ficam concentrados vários cafés, para todos os gostos.


Biblioteca Pública de Vancouver

Depois do café, fomos a Yaletown procurar uma liquor store para comprar um vinho. Fomos convidados para um jantar à noite, na casa de uma amiga japonesa que conheci na época em que morei em Vancouver, e queria levar um agrado para ela e o marido, um canadense de Vancouver Island, uma pequena ilha próxima a Vancouver, com estilo extremamente inglês.

Keiko, a japonesa, foi nos buscar no hotel em um carro que, apesar dela ter me explicado por email a marca, eu não tinha ideia do que seria. Guardei apenas que era marrom. Ela é de uma cidade menor do Japão, que eu não consigo repetir o nome. Só sei que tem um vulcão ativo na frente da cidade e que, da casa dos pais dela, é possível ver (e sentir!) a fumaça do dito cujo.

O marido dela, o Ben, é um arquiteto canadense que conhece um pouco da obra de Niemayer. Eles têm uma filha linda, a Maya, que herdou os olhos puxados da mãe e as bochechas rosadas do pai. São um casal a cara de Vancouver. Ben tem uma irmã mais velha muito simpática que também participou do jantar e que defende a bandeira das minorias, o que também é a cara de Vancouver!

O jantar começou com vinho e cerveja e alguns tira-gostos. De repente a Keiko serviu a mesa e eu e o Newtinho ficamos extasiados. Era um banquete japonês! Cada um preparava seu sushi na hora, com os ingredientes da mesa, que iam desde os peixes crus (salmão, atum e peixe branco) a carnes, legumes e frutas. Também havia uma salada especial com um tempero japonês incrível. E uns espetinhos de frango picantes que me arrependi muito de não ter comido. Durante a comilança, saquê para acompanhar.


Jantar japonês da Keiko

Depois do jantar, Keiko nos surpreendeu com a ideia de fazer morritos. Ela achou que era uma bebida comum no Brasil... Não negamos e entramos no ritmo. Com nossos copos e sentados a beira da lareira, terminamos a noite com a promessa de uma visita do casal ao Brasil.

4º dia: frutas, chás e barcos

Era nosso último dia em Vancouver e queríamos um programa bem legal. Keiko havia dito que gostava de comprar peixes e frutas em Granville Island, uma ilha quase colada em Vancouver, que concentra mercados, lojas de arte e restaurantes. Na Hornby Street pegamos o Aquabus e em poucos minutos já estávamos na ilha.


Do centro de Vancouver à Granville Island 
O ponto de ônibus de Granville Island 
O mercado é simplesmente encantador. Não muito grande, mas com muitos peixes frescos, frutas, flores, chás e músicos. Compramos cerejas frescas para comer na beira da ilha, vendo os barcos chegando e saindo. Rodamos as lojinhas e almoçamos um sanduíche de camarão, abacate e broto de brócolis (uma delícia!), na lanchonete do mercado. Depois tomamos um café acompanhado de um buttercake de morango e chocolate, sentados nos banquinhos de frente para os barcos.


O mercado público 

Um passeio pelas ruelas da ilha
O mercado público

Uma visão da ilha
De volta a Vancouver, fomos ver o pôr do sol no Canada Place, onde se tem uma vista maravilhosa da baía e se pode curtir um pouco a brisa do Pacífico. À noite encaramos novamente as fatias de pizza, afinal o dinheiro já estava se esvaindo...

Visão do Canada Place, onde as pessoas partem para viagens de navio para o Alasca

5º dia: Victoria de ferry boat

Dia de ir embora para Victoria, capital de British Columbia. De Vancouver pegamos um ferry boat para chegar à ilha. A viagem dura mais de duas horas, mas nem vimos passar... No caminho íamos curtindo a vista do mar e brincando com as gaivotas que nos acompanhavam. Há um café dentro do ferry muito legal, onde tomamos chá e comemos cookies.


Do convés do Ferry boat, indo para Victoria

O convés

Uma das vistas do caminho para Victoria

As gaivotas acompanham toda a viagem

Chegando em Victoria descobrimos que estava tarde para ir visitar o Buchard Gardens, um jardim maravilhoso que havia visitado há dez anos. Ele é um pouco afastado da cidade e, como não conseguimos sair cedo de Vancouver, seria meio corrido ir até lá. Mas o clima da cidade também é muito bom e fomos curtir a tarde em visitas livres pelas ruas e pelo porto onde ficam os barcos e lanchas das famílias mais ricas de BC.


O Parlamento de British Columbia

Pequeno porto de Victoria
Á noite circulamos pelo centro e descobrimos que, diferente de Vancouver que tem um ar mais moderno e cosmopolita, Victoria tem um clima de interior da Inglaterra. As pessoas são bem vestidas, elegantes e muito simpáticas com os turistas. Comemos uma refeição bem inglesa: sanduiche, peixe e batatas. E mais tarde fomos parar em um pub fantástico, com música ao vivo e com um repertório que ia de Beatles a Bob Dylan. Provamos a cerveja produzida lá, que era muito boa, e voltamos para o hotel tristes, porque no dia seguinte teríamos que voltar para o inverno inóspito de Edmonton. Mas estes dias foram valiosos demais para nós, porque deu para sentir como o Canadá é um país enorme e cheio de diversidades.

Na chegada em Edmonton já sentimos a diferença entre British Columbia e Alberta... Enquanto em Vancouver e em Victoria pegamos dias de sol com temperaturas positivas, em Edmonton os termômetros marcavam -10c e uma neve fina caía sobre nossa casinha. Agora é retomar a rotina, Newtinho na universidade e eu em mais um curso de inglês, refazer as finanças e planejar a próxima viagem. Provavelmente será em Quebec City e Montreal. E afinal de contas, existe algo na vida melhor do que viajar?

sexta-feira, 7 de maio de 2010

Manifesto a favor de uma vida dupla

Fui criada para encontrar no trabalho o sentido da vida. Acho que a geração dos meus pais achava que nós poderíamos ser tudo que quiséssemos desde que trabalhássemos com aquilo que gostássemos. Doce ilusão. Esta não é a vida, ao menos esta não foi a vida para mim.
Trabalho pode ser bom sim, mas pode ser péssimo também. E independente disso, trabalho é simplesmente trabalho. Como diz uma amiga: “se trabalho fosse bom ninguém te pagava para fazer”. Claro que é sempre melhor trabalhar com aquilo que você gosta (se você tiver a sorte de ter esta clareza), afinal a maior parte de sua vida será gasta com a labuta. Mas, independente de ter escolhido a profissão mais parecida com você, é difícil imaginar que acordará todas as manhãs alegre e satisfeito, louco para viver mais um dia de trabalho. Mais um dia de chefes, colegas competitivos, pepinos, erros, canseira, repetições...
Outra coisa que sempre ouvi dos meus pais é que o trabalho é algo natural do ser humano. Tenho que dizer que novamente venho discordando dessa história. Como assim natural? A própria origem da palavra parece nos dar uma dica. Ela vem do vocábulo latino tripaliu- denominação de um instrumento de tortura formado por três (tri) paus (paliu), uma espécie de chicote que, digamos, incentivava escravos e pobres sem posses a “cooperarem” e realizarem as tarefas que lhes eram reservadas. Trabalhar significava então ser torturado por meio do tripaliu.
É claro que com o tempo as coisas mudaram. O trabalho passou a ser considerado digno do mais digno ser humano e, mais ainda, passou a ser defendido por muitos como algo “natural”. Daí a ideia de que se você trabalha com o que gosta, tudo será maravilhoso. A realização será plena e o dinheiro, bem, ele virá... Ok, mesmo que ele venha. Será que todos os seus vazios serão preenchidos naquela labuta, ainda que sob o tema escolhido e com a remuneração adequada? Tenho que dizer que não. O ser humano é infinitas vezes mais complexo do que esta criação meramente produtiva deste “trabalhar” diário.
A noção de tempo, por exemplo, vem sendo cada vez mais encaixada nas demandas de produtividade das empresas, repartições e universidades (sim, porque até estas já se moldaram aos parâmetros capitalistas). A hora de ter um filho não está mais ligada ao tempo biológico da mulher, mas sim ao tempo de carreira que vem sempre em primeiro lugar. Não basta casar, não basta amar, não basta querer, é preciso poder. Uma mulher jovem que ainda pretenda ter um filho é quase um incômodo para o mundo do trabalho. Afinal, há o tempo da gestação, há o tempo da amamentação e há ainda o tempo da escola, dos médicos, das doenças e dos infinitos problemas domésticos. E não é preciso dizer que todos estes tempos tomarão o tempo precioso do trabalho.
Claro que se não há trabalho organizado não há alimento, não há moradia, não há escola, não há como a sociedade progredir. Mas também se não há tempo livre não há perpetuação da espécie, não há filosofia e muito menos poesia. Não estou aqui para defender o ócio total, apesar de achar que um pouco dele é necessário para que a humanidade possa encontrar caminhos melhores de sobrevivência. Mas gostaria que fosse possível admitir que não somos seres plenamente encaixáveis em uma única função. Somos muito mais que isso. Somo seres repletos de curiosidades, dúvidas e sonhos. E isso nos fez chegar onde estamos. A maioria das pessoas interessantes vivia vidas duplas e, por vezes, múltiplas. Da Vinci, por exemplo, além de um artista fantástico, era um estudioso da matemática e da medicina. Marx nunca trabalhou e serve de base para as ciências sociais ainda hoje. E, entre os recentes e conterrâneos, lembremos de Drumonnd, que era um mero funcionário público e escreveu uma das obras mais lindas que conheço.
Até quando vamos fingir que é possível se encaixar em um único papel? Quando vamos aceitar que o desencaixe é a coisa mais interessante do ser humano? Por estas e outras é que sou a favor de uma vida dupla. Se a sociedade não te permite viver escancaradamente suas diferentes aptidões e desejos, é preciso criar uma saída. Admitir a dualidade é um primeiro passo.

Dualidade

Enquanto tu cagas eu cago para o mundo.
Esse mundo verde/cinza de esgoto e alegria
Não tenho estilo literário
Não tenho ao menos um caminho de vida
Sou paraninfo de uma história única, a minha.

Sem referências e discursos únicos
Sou dual em todo o sentido possível
Tenho corpo pulsante e cabeça pensante
Me encanto com o mar e com a Clarice
Sou um paradoxo em formato de gente
Corpo e mente em desarmonia total

Bicho pensante, corpo com cérebro
Adoro a sensação do sal e da água
Amo um livro bem lido
O envolvimento com alguma causa é sempre possível
Assim como o mero desenvolvimento corporal

Apoio sobretudo as causas impossíveis
Me lixo para as causas politicamente corretas
Escrevo e viajo porque preciso
Preciso manter a divisão sossegada
antes que ela me mantenha em cárcere 

quarta-feira, 3 de março de 2010

E que venham as águas de março

Ando meio pessimista - não comigo, passei dos trinta – mas ando meio estranha aos acontecimentos locais, nacionais, mundiais....
Acredito numa grande consertação  e desacredito na possibilidade real disso

Faltam-me ideias e sobram-me cigarros
transbordam sentimentos ineficientes
inúteis para a sociedade eficiente

Abro as janelas em busca de ar
vem a chuva de março
amiga, esperada, ansiada
fecharam-se as chances de um passeio
desapercebido, desavisado, calorento 
Já se vão as chances de um verão

E que venham fortes as histórias de março
e que sejam fortes as histórias do ano
e que sejam atentas as cidades da história
e que façam espécie os seres humanos!!

quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

Terça-feira analítica

As terças-feiras costumam ser relativamente livres para mim. É o dia da minha sessão de análise e, muitas vezes, vira também o dia de uma cerveja com os amigos, de leitura de um poema antigo, de bate-papo filosófico e regressivo. Tem sido assim há alguns meses.

Ontem foi terça-feira e o dia acabou sendo uma grande mistura de todas as possibilidades habituais previstas para a data. Fui para a análise, fritei a cabeça, não consegui mais trabalhar e no fim do dia tomei uma cerveja doméstica, na companhia do maridão. A conversa virou uma confusão só, do jeito que eu gosto, e fluiu tanto que nos levou a comprar mais algumas latinhas.

Antes que algum moralista de plantão repreenda esta decretação de uma terça livre (em plena terça!), vou logo dizendo que esta é uma válvula de escape que todo cidadão deveria ter direito. Ter tempo para pensar na vida, conversar, ler algo que está na estante, enfim, reavaliar alguns pontos para seguir adiante. Pena que o capitalismo e o catolicismo não entendem que isso seja importante.

Bom, voltando à terça, ontem o ponto em análise era uma vontade enorme de poder usar toda minha consciência sobre algumas questões para de fato mudar meu comportamento diante destas celeumas. Sim, porque entre entender como as coisas funcionam e as modificar existe um longo caminho. E neste ponto a psicanálise é bem ingrata, já que ela ajuda a clarear, mas é inócua na transformação. Passamos a conviver com nossos eus de todos os tempos - passado, presente e futuro- e o gerenciamento desta turma toda é complicado... E por aí foi a conversa.

Mas como também não é só de conversa que se vive uma terça-feira, resolvemos, eu e o Newton, escrever alguns pensamentos, sem compromisso nenhum. A brincadeira de colocar no papel ideias totalmente abstratas a quatro mãos foi bastante divertida. Tudo iria se perder se não contássemos com este espaço aqui, mas já teria valido pelo momento.
Então aí vai um trecho da última terça-feira analítica. O texto é meu e do Newton.

Repito, me repetem
tudo se repete
e vivo repetindo
De repente tudo é o mesmo de ontem

O mesmo é de ontem
a consciência é de hoje
mas ela não deixa, deixa...
Deixa que eu repita, me repitam
tudo se repete
e vivo repetindo

De repente tudo é o mesmo de ontem
Reflito, tudo muda
e nada muda
O meu sangue mata baratas.

quarta-feira, 10 de fevereiro de 2010

Ladrões de discurso

Há uma prática muito comum no mundo dos ditos encaixados: a prática de roubar o discurso alheio. Pense com calma e verá que já passou por uma situação destas. Funciona assim. O sujeito (ou a sujeita) é ótimo ouvinte de suas ideias, seus planejamentos, suas interpretações sobre as coisas. Escuta mesmo, concorda, emite sinais de admiração. Vocês inevitavelmente se aproximam e a coisa só piora. Mas até então você não percebe por onde está indo. A proximidade faz com que você fique disponível para trocar ideias sobre todas as dúvidas da pessoa que, no fim, se mostra bem imatura, frágil até. E você quer ajudar. Um certo dia inesperadamente você escuta um discurso familiar, tem dúvida, presta atenção e percebe que é o seu discurso. Mas não é a sua voz e o crédito também não é seu. Há outro timbre e outro “autor” de todas aquelas idéias que surgiram dentro da sua cabeça e do seu esforço de pensar soluções. Já era, seu discurso foi roubado.